Cotidiano

WhatsApp, tsunami e conspiração

servido por: Kauan Lima

Sentado, esperando o último ônibus que pego em direção a minha casa, após o trabalho. Já passava de 22h. Estava eu, um espaço no banco e uma mulher, que insistia em fumar, mesmo não podendo ali. A fumaça me incomodava muito, mas nada falei.

Uma senhora se aproxima e senta no espaço vago entre a fumante e eu. Ela era baixinha e tinha pele morena, aparentemente, queimada de sol. Eu estava com os fones nos ouvidos e mexendo em um aplicativo para controle financeiro, que havia baixado pela manhã. A senhora, que mal tinha sentado, disse:

– É joguinho?

– Não, é um… não, não é joguinho.

Eu respondi, acreditando ser inútil tentar explicar o que era aquele aplicativo e retirei os fones.

– É “Zapi Zapi”?

– Oi?

– “Zapi Zapi”, que passou o Facebook. Passou, não passou? Ouvi dizer que tem muita gente usando.

Ela emendava uma pergunta na outra, respostas, tudo junto e quase sem tomar fôlego. Eu estava cansado do trabalho e não queria dar muita trela. Mas não teve jeito…

– Vai ficar complicado para o Facebook, né? “Zapi Zapi”… é “Zapi Zapi” que fala? Vai passar eles. Já não passou? Mas esse povo, de hoje em dia, deveria ser mais esperto. Gente que deveria ser antenada… parecem uns bobos mexendo nisso. Fica só aí nisso, enviando…

Nesse momento, pensei que teria um tempo para responder, mas ela imitou alguém mexendo rapidamente no celular e já emendou:

– O povo parece que tá ficando bobo! Até mesmo pessoas próximas da gente, sabe? Falam bem de você, aí você sai e eles já falam mal nessas coisas aí. Na sua frente, tá tudo bem, na hora que você vira as costas, eles começam a digitar, falando mal de você…

Não conseguia esconder minha vontade de rir e fiquei com um sorriso bobo na cara. A mulher, que fumava ao lado, já não fumava mais e olhava para a senhora com cara de “você não vai parar de falar?”. A senhora continuou:

– Mas eu acho que o povo tá ficando bobo. Tudo isso daí é para distrair o povo. Enquanto os magnatas estão lá, só ganhando dinheiro, aplicando em ações… o povo aqui, tudo bobo. Tudo enfiado nessas coisas (Facebook e WhatsApp). É gente maquiavélica que faz isso. Tudo é pensado por eles…

Naquele instante, só conseguia pensar se ela já havia ouvido falar de Nicolau Maquiavel, quem, provavelmente, foi o responsável pela origem do termo. Bom, também não tinha certeza disso… ela continuou:

– Mas o povo tá mais bobo mesmo. Acho que é essa história de acabar o mundo e tudo mais. De 2000 pra cá, o povo parece que vem ficando mais bobo. Você não acha?

Eu ainda tentei argumentar:

– Então, quase todo ano eles vêm falando isso, que o mundo vai acabar e tal…

Ela fez que não com a cabeça e disse:

– Não! Quase todo ano, não.

Resolvi reforçar:

– Em 2012… eles sempre vêm com essa.

Ela insistiu que não com a cabeça, mas cedeu:

– É, 2012, né? Bom, mas tá acontecendo umas coisas muito estranhas, né? Aquele tal de “surinami”. Não teve lá?

Não contive o riso e quase gargalhei. Ainda estava com um sorrisão aberto, para tentar controlar minha vontade de rir. Ela apenas continuou:

– Não teve? Naquele lugar lindo, gente rica e tal. Todo mundo na piscina, se divertindo… aí veio a “ondona” e levou tudo, né não?

Nessa hora, eu tive certeza que ela assistiu ao filme O Impossível, que relata a história de um casal e filhos durante o tsunami. Ainda tentava conter o riso pela palavra “surinami”. Ela continuou:

– Ai, ai… eles estão dizendo da cidade… como fala? A cidade do futuro… “Dabi”, né?

– Abu Dhabi. (respondi)

– Isso. Tudo rico, né? Falaram que é a cidade do futuro…

Nesse momento, o ônibus ia sair. Ficamos de pé e rumamos, em fila, para a porta do veículo. Um senhor olhou para mim, como se pedisse passagem, e eu abri espaço. Ele ficou na minha frente. Entre a senhora e eu. Ela continuava falando algo e se virou. Quando viu que não estava bem atrás dela, estendeu a mão, tocou meu braço e, sorrindo, me disse:

– Bom, o que eu acho é isso.

Ah, a sabedoria popular!