O absurdo banal!

Há mais de dois meses, estou tentando cancelar minha conta na NET e não consigo. Diariamente, presencio pessoas sendo tratadas como gado no metrô do Rio de Janeiro… e muitas delas acham graça disso. Há pouco tempo atrás, funcionários da SuperVia davam chicotadas (de borracha) em passageiros para acomodá-los, de forma desumana, nos trens superlotados. Todos esses absurdos são fatos naturais na nossa realidade, parte do nosso cotidiano.
Tão normais que o espanto viria se eu tivesse conseguido cancelar, em menos de 05 minutos, o tal serviço de merda; ou mesmo se o Metrô Rio me devolvesse, voluntariamente, o valor da passagem nos dias em que faço uma sauna indesejável e obrigatória porque o ar-condicionado do trem quebrou ou porque eu demoro o dobro do tempo da viagem normal pela ineficiência e incompetência deles.
Vivemos uma inversão da percepção, onde o abuso é o cotidiano e a gentileza e o respeito são a exceção. Mas por que isso acontece? Por que permitimos que esses parasitas se finquem em nós de maneira simbiótica e os alimentamos, fruindo até certo gozo disto, a despeito do mau que nos causam?
Para mim, o principal aspecto é Educação. Kant dizia que o homem não é nada além daquilo que a educação faz dele e continuava afirmando que é no problema da educação que assenta o grande segredo do aperfeiçoamento da humanidade.
Viagens filosóficas à parte, de uma forma geral, tendo a concordar com ele. Para mim, sem qualquer educação, pouco nos diferenciamos de animais.
Uma das principais características, se não a mais importante, que diferencia os homens dos animais, é a capacidade de racionalizar, concatenar o pensamento lógico; bem como o registro e a transmissão de conhecimentos. Tais capacidades certamente se tornam mais robustas com o processo educacional.
Ao longo da história, milhares de pessoas estudaram o mundo que nos cerca e as propriedades dele: nossas mentes, nossos corpos, nossas relações, nossas histórias. Todos esses esforços culminam no conhecimento e informações disponíveis hoje. Um processo contínuo e progressivo, que se alicerça no estágio pretérito produzido.
Entretanto, quando viemos ao mundo, não possuímos esses conhecimentos. Ele nos vão sendo transmitidos, assimilados e elaborados. Com o tempo, passamos a interpretar símbolos, formular associações, reconhecer padrões.
Discussões religiosas à parte, o que aprendemos claramente nos molda, inclusive a respeito de valores.
Quem nunca ouviu a frase “fulano não tem educação”, ou algo do tipo, para se referir a alguém que não se comporta dentro dos padrões esperados de convivência? Assim, voltando à ideia de Kant, o homem precisa ser ensinado sobre o mundo, sobre valores e o próprio papel na sociedade (o que inclui direitos e deveres).
Dei toda essa volta apenas para reforçar um ponto: somos mal-educados!
Vivemos num país onde alguns poucos se esforçaram bastante para criar inúmeras barreiras no processo de difusão de conhecimento, acarretando numa esquizofrênica carência de valores, noções de direitos e deveres. Manobras de manipulação (como futebol, carnaval, etc.) são valoradas como formas quase que exclusivas de uma identidade e unidade cultural. Complexos entraves burocráticos, cujos meandros, apenas iniciados trilham – tornam quase impossíveis o controle, a ação e a contestação por parte dos cidadãos comuns. O que resta é o sentimento de impotência e indiferença. De que adianta? Não vai mudar nada mesmo, é como pensamos.
Todos esses mecanismos foram criados para perpetuar e concretizar interesses de uma pequena minoria. Não são os objetivos de uma sociedade (que, nesse caso, não faz nem muita ideia de quais sejam esses propósitos). País do futuro? País de/para todos? Ridículo! Se eu continuo tendo minhas vantagens, por que eu mudaria alguma coisa?
Ainda que, como em qualquer situação de estresse, alguns (poucos) momentos de catarse surjam, onde gritamos e reivindicamos (postamos comentários e fotos no Facebook e Instagram), convencendo a nós mesmos de que somos engajados e que estamos fazendo a nossa parte, eles passam e tudo volta ao grotesco normal. É inócuo.
Não tenho respostas prontas… nem acho que o caminho seja simples. Acredito apenas que as algemas se rompem quando agimos da forma oposta. Quando começamos a pensar em sociedade, a agir de maneira colaborativa e coletiva, sem esperar ações de cima para baixo, criando e construindo num fluxo intenso e que não pode ser ignorado. A resignação perante a impotência é o abraço das fraquezas e a subestimação do potencial pessoal inato. Informe-se. Eduque-se. Leia. Compreenda. Entenda. Compartilhe. Colabore.
Inúmeras iniciativas já existem com essa visão colaborativa (é só procurar) e elas precisam ser reforçadas.
A internet nos possibilita inúmeras oportunidades de conhecimento e aprendizado, sem nem sairmos da frente do computador.
Mas nada disso faz qualquer sentido se não sabemos o que queremos de nossas vidas. O que desejamos de uma sociedade. Se minhas ações condizem com esses projetos. Nada muda se eu não mudar.
Longe de qualquer pretensão de convencer ou proferir lição, compartilho aqui com você, leitor, minhas reflexões, direcionadas mais a mim mesmo do que a qualquer outro. Pois talvez elas sejam as suas também. E quiçá, só porventura mesmo, isso nos leve à ação.
P.S.: dedico esse texto à NET.