O talento para a redundância
Não consigo tirar essa ideia da cabeça, desde que assisti o middle season da sexta temporada de The Walking Dead.
Já tivemos Frank Darabont, que fez um episódio piloto incrível, cheio de personalidade e, ao mesmo tempo, fiel pra cacete ao material original, mas não conseguiu manter o nível ao longo da primeira temporada. Acabou sendo substituído por Glen Mazzara, que nos deu aquele Governador e destruiu, por completo, o arco da prisão. E, no lugar dele, entrou Scott M. Gimple, que está, no comando da série, desde o quarto ano. Soube levar o programa de volta aos trilhos, soube dar personalidade – mas sendo fiel aos quadrinhos – e soube criar cliffhangers de explodir a cabeça…
Dos três, parece ser o melhor showrunner até agora, mas, como nada é perfeito… temos um grande problema nessas três últimas temporadas de The Walking Dead. E sabe qual é? A desonestidade do Sr. Gimple, que parece ser incapaz de assumir o hype e a expectativa que cria, e se perde, junto com os roteiristas, insistindo em ficar contando sempre a mesma história, tocando sempre o mesmo disco!
Nos quadrinhos, The Walking Dead é um universo em ebulição, onde nada permanece como está por muito tempo. Robert Kirkman, acompanhado de Charlie Adlard, não tem a menor dó de descartar personagens importantes. Ora de forma banal, ora de forma extremamente sádica. Não tem o menor receio de colocar os personagens em situações limites. E sempre que a história parece cair no marasmo ou se tornar repetitiva, aparece um elemento completamente inusitado, que vira tudo de cabeça para baixo e abre milhões de possibilidades diferentes. E nessa novelona que eles vêm criando, há mais de 140 edições, os personagens crescem e os conflitos mudam…
Mas essa evolução é algo que The Walking Dead parece se negar a aceitar na TV. Kirkman é parte extremamente ativa da trupe de Gimple! Tanto que, dizem as más línguas, é por conta dele que Darabont e Mazzara caíram… ele exerce uma influência que poucos criadores conseguiram ter, ao ver as próprias obras adaptadas para outros meios. Só que Kirkman e Gimple parecem agir como uma mãe superprotetora e, assim, querem deixar os personagens do mesmo jeitinho que conceberam, evitando que eles amadureçam!
Mas, antes de continuar dando pedrada e ser acusado de hater, é bom deixar bem claro que, quando eles acertam, acertam com gosto! Os três primeiros episódios dessa temporada são impressionantes! A construção de roteiro e toda a mise-en-scène criada deram um fôlego novo à série. Logo no episódio piloto, a escala é jogada lá para cima, o suspense muito bem construído, as sequências de ação muito bem dirigidas e novos personagens são apresentados… a expectativa criada foi imensa! E aquele final? Chegou com o pé na porta, colocando todas as cartas na mesa e provando que TWD tem artifícios o suficiente para ser uma das melhores em exibição!
Temporada após temporada, a série vem arrebentando recordes e o primeiro episódio deixou claro o porquê.
O segundo episódio seguiu o mesmo caminho e não deixou a expectativa cair, servindo de ótimo guia para o terceiro. Um dos melhores de toda a série (se não, o melhor). O link com o nosso mundo atual, todos os temas – levantados pelos melhores exemplares das histórias com zumbis – estão ali. E a “morte” do Gleen, que me fez pular da cadeira! Mas, ao mesmo tempo que elevou ainda mais o nível, também acabou sendo o início da queda… ficou a promessa de conflitos, que levariam a série por novos caminhos. Mas tudo foi, friamente, desperdiçado e substituído por soluções pouco inspiradas, simplistas e esquemáticas.
Tivemos uma quebra de ritmo, um respiro necessário, que ajudou a desenhar quem é o Morgan e de onde vem o motivo daquele que parecia ser o grande embate dessa temporada… e o contraponto ao Rick.
E, a partir daí, foi ladeira abaixo…
Enfim… e, aí, veio o marasmo. O trato, que começou a ser elaborado com os três primeiros episódios, foi quebrado e voltamos ao mesmo círculo vicioso que Gimple e Kirkman se colocaram… os mesmos temas, as mesmas discussões, os mesmos questionamentos. Muda o ambiente, entra e sai personagem, a ambição continua a mesma… e a grande frustração é o fato de que é uma ambição tão pequena. As surpresas acabaram se mostrando muito menos interessantes do que prometiam e, há três anos, ficamos com a sensação de estar em um ciclo e assistir sempre à mesma coisa…
Toda a competência em causar sustos e construir a narrativa é substituída por uma preguiça.
E eu preciso fazer três confissões antes de encerrar esse texto:
01) Acho muito interessante como a série consegue se manter fiel ao material original, mas construindo o próprio caminho. Só que esse é um caminho arriscado pra caramba;
02) Caí em todas as pegadinhas armadas pela esperta desonestidade do Sr. Gimple. Foram oito episódios, onde muita coisa aconteceu, mas quase nada saiu do lugar e, novamente, a promessa para o que vem a seguir é imensa;
03) Apesar dos pesares, The Walking Dead ainda é a minha série favorita em exibição. O gosto amargo que fica ao final do oitavo episódio, só se evidencia depois de algumas análises mais calmas e, talvez, o erro seja justamente esse! Analisar demais um objeto que só quer ser ordinário. E sinceramente? Ser ordinário é tudo que, às vezes, uma boa obra precisa ser;
Para encerrar?
Volto a afirmar que a série tem cartas na manga de sobra para ser uma das melhores da atualidade. O início dessa temporada deixou isso claro e os quadrinhos estão aí para ajudar a comprovar essa minha esperança. Dúvida? Vai agora comprar os 18 volumes encadernados lançados por aqui… e se divirta enquanto a série não retorna, lá em fevereiro!