Infância, dinheiro e o essencial
O Brasil, até os anos 90, foi considerado o país do futuro. Hoje, por aqui, ninguém usa mais este termo… ele foi emprestado a outros, que experimentaram algum desenvolvimento após longos períodos de guerra ou exploração, como no caso de Angola.
O que chama a atenção: quando se fala em “país do futuro”, é sobre algo num longo prazo. Traçando um paralelo, é como o desenvolvimento infantil, por exemplo. Acreditou-se tanto neste slogan, que esquecemos de cobrar e representar as crianças, em tudo que diz respeito aos pequenos.
Houve algum avanço, sim, como a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente, foram feitas campanhas contra o trabalho e a prostituição do menor de idade, redução das taxas de transmissão de HIV de mãe para filho, redução da mortalidade infantil, mas ainda é o começo e é feito de forma bem morosa.
Um país – do tamanho do Brasil – tem recursos suficientes para desenvolver cidadãos plenamente, sempre teve… se gabar de ser a oitava economia do planeta, todo mundo faz, mas ninguém teve a capacidade de olhar para o lado.
Segundo a ONG Plan Internacional, o Brasil é o quarto país do mundo em número de casamentos infantis. É também onde se explora – de toda forma – a criança e não lhe é permitida o desenvolvimento pleno, a brincadeira, o lúdico. A UNICEF ainda pontua que os dados são piores entre afrodescendentes, indígenas e pobres.
Apesar das estatísticas serem um verdadeiro massacre, há apelos midiáticos para a redução da maioridade penal e o aval de camadas da sociedade para o encarceramento das crianças e jovens.
Sem contar que o lado lúdico da TV aberta na educação – que foi um grande aliado num passado recente – desapareceu da programação da maioria dos canais, deixando essa tarefa para canais de TV por assinatura, aos quais só uma minoria tem pleno acesso.
A educação, não só o ensino, é papel de todos, basta olhar para si próprio e ver que, quem você é hoje, teve início lá na infância. A presença dos pais é de fundamental importância, mas a maioria tem negligenciado atenção e instrução, em nome de dinheiro e conforto, deixando a orientação da vida dos filhos na mão de babás eletrônicas, notebooks e tablets.
Ensino de qualidade é importante, sim, mas é oco sem educação e orientação adequada. Não haverá desenvolvimento infantil sem apoio maciço da iniciativa privada, sociedade e governo… em outras palavras: de toda sociedade. As instituições precisam deixar de lado a insensibilidade do dinheiro e do poder, para voltar a atenção para o que estes novos cidadãos venham a necessitar para se desenvolver melhor, para crescer de forma saudável física e mentalmente, ficando longe do crime e das drogas. Focar no conhecimento, sabedoria, tecnologia, formação profissional e pessoal, com caráter e respeito.
Seríamos todos mais felizes, tranquilos e ricos – até financeiramente. Vamos à escola… depois, labuta ou universidade, não importa. Ao se tornar adulto, a maioria esquece que já foi criança; dos medos, anseios; e não usa a lembrança de tudo que o ajudou na formação pessoal. Os miúdos não têm voz na sociedade, não há representatividade para eles – e nem sabem o que é isso.
Nós, adultos, usamos o ensino como custo, não como investimento… esse é um dos erros mais graves. Pensamos muito em dinheiro. Está na hora de esquecer isso e olhar para o desenvolvimento. Não se percam no raciocínio da TV, que pinta a infância do jeito como o menino da classe média vive. Também é uma realidade possível, mas não é a da maior parte. A maioria das crianças não tem a vida colocada em novela e publicidade. Qualidade de vida não é só potencial de consumo. É também consciência, acesso e plenitude – de alimento e conhecimento.
Empatia pelas reais necessidades das crianças está em falta.
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