Thor
Quando Thor estreou, eu confesso que estava com um hype gigantesco nos filmes da Marvel.
O grande desafio era: como adaptar um universo tão fantástico para o cinema, sem perder o tom (levemente) pés-no-chão dos filmes anteriores e, ainda assim, se manter fiel.
E é um prazer dizer que eles conseguiram! Criaram algo único, que não tem a menor vergonha do material de origem, sabe ser respeitoso, mas – ao mesmo tempo – original.
O Thor, criado por Lee e Kirby, não é o deus viking, mas algo diferente e apenas inspirado naquela mitologia. O longa entende isso e não tem a menor vergonha de enfiar o pé no fantástico.
Tentando seguir o modelo, mesmo que pouco, da estrutura de HdF, o filme começa em um momento de virada para o protagonista e volta ao passado para nos apresentar o personagem. Mas, diferente do longa do Ferroso, aqui a sequência é trabalhada para gerar suspense e mistério… OK… o objetivo é alcançado, mas acaba sendo enfadonho. Se essa cena tivesse ficado na sala de edição, não faria falta alguma ao produto final.
Aí então, vamos ao passado e, com a imponente narrativa de Anthony Hopkins, acompanhamos a primeira grande guerra entre os guerreiros de Odin e os gigantes de gelo de Jotunheim. O efeito para rejuvenescer o ator é convincente e resistiu durante esses anos. Sem o menor medo de afundar no universo fantasioso em que o filme é trabalhado, conhecemos a grandiosa Asgard, o nosso protagonista e os coadjuvantes. Trilha, direção de arte, fotografia, decupagem… tudo funciona para nos colocar naqueles mundos.
E talvez esse seja o grande mérito do filme. Em poucas cenas, ele entra com os dois pés no fantástico e, quando menos percebemos, já aceitamos aquela realidade e nos importamos com os personagens.
O que me faz repensar o comentário que fiz acima. Talvez aquele começo seja importante para criar o vínculo com o mundo que foi apresentado nos filmes anteriores do estúdio. Talvez aquele começo seja o pé na realidade necessário para fazer com que o universo fantástico, que nos seria mostrado logo depois, não se tornasse tão estranho e, ao mesmo tempo, para que nós pudéssemos ter um contraponto entre a realidade e a fantasia… enfim… divagando…
Voltando…
O roteiro é contido e certeiro. E a direção de Kenneth Branagh é precisa! Com olhares, silêncios e uma ótima edição, vamos descobrindo os personagens, as motivações… enfim… a arrogância do protagonista, a relação com pais e amigos, a competição com o irmão. É informação pra caramba, mas tudo é passado de forma natural e simples.
Mais uma vez, a Marvel Studios surpreende na montagem do elenco, ao colocar atores badalados ao lado de nomes menos relevantes ou desconhecidos. Anthony Hopkins como Odin é uma escolha imponente e mostra como Feige sabe jogar bem com as cartas que tem. Chris Hemsworth surpreende e convence como Thor. E o Loki de Tom Hiddleston é devastador! Impossível não odiar e, ao mesmo tempo, entender o personagem…
As cenas de ação são grandiosas. A invasão à Jotunheim é empolgante e, mesmo tendo ficado muito escura (algo que o roteiro assegura uma justificativa), não decepciona. Pelo contrário!
Então temos o plot point, voltamos ao começo do filme e caímos na Terra. Nesse momento, o longa perde um pouco do impacto e quase cria uma barriga. Mas as piadas e o choque cultural que a chegada de Thor à Midgard causam, sendo entrecortados com a manipulação de Loki em Asgard, mantém o ritmo e o resultado é um desenvolvimento interessante dos personagens. Temos um grande respiro, mas que serve de preparação para a mudança do herói e o clímax.
A cena do deus caído, tentando recuperar a grandiosidade, é empolgante, tensa, dramática, brega e dá toda a chance de Chris Hemsworth brilhar e justificar a escalação. E guarda uma curiosidade… tentando fazer com que o longa se tornasse ainda mais conectado ao universo que estava sendo criado, e ao vindouro filme dos Vingadores, Gavião Arqueiro foi incluído nessa sequência. Sem que isso tivesse sido planejado inicialmente. Reparem! Se você retirar o personagem, não faz falta alguma! Mas nenhuma mesmo! Acaba como um fan service interessante…
O filme tem problemas! Na verdade, para mim, tem um grande revés: a luta contra o Destruidor. A preparação para esse combate é tão bem construída (só com muito mau humor, você passa pela cena do retorno do Mjölnir sem se empolgar). E quando seu hype está lá em cima… tudo se resolve com uma martelada!
A reviravolta final dá outra dimensão à Loki e a batalha dos irmãos compensa a frustração causada pela cena de luta anterior.
Branagh, com toda a experiência em dramas shakespearianos, sabe muito bem como explorar o conflito entre os dois irmãos para além da pancadaria, mas – ao mesmo tempo – não decepciona quando as lutas começam! E abarrota o filme com o truque conhecido como ângulo holandês!
Para quem não conhece, é um recurso fotográfico que consiste em uma leve “entortada” na câmera para, assim, mexer com as sinapses do espectador. O antigo seriado do Batman, estrelado por Adam West, usava e abusava desse mecanismo. Anos depois, a MTV adotou a técnica quase que como uma regra… enfim… e em Thor, Kenneth Branagh filma, sem o menor pudor, com o ângulo holandês!
Enfim…
“Walk”, do Foo Fighters, nos créditos finais, veio como a cereja de um bolo pop e extremamente bem-sucedido! Thor é aventuresco, fantasioso e um passo sutil, diferente do que foi estabelecido com o Homem de Ferro. Mas, ao mesmo tempo, extremamente coerente – em estilo – com o projeto que estava sendo definido. Acaba também sendo ainda mais despretensioso e, de uma forma estranha, não alcança o senso de novidade que os dois longas protagonizados por Downey Jr. tiveram. Talvez, por isso, não entre na lista de favoritos de nenhum fã dos filmes da Marvel… enfim… só divagando…