Cinema

Babilônia | Crítica

servido por: Caio Sandin

O que você faria se tivesse todos os recursos do mundo a seu dispor para materializar o trabalho dos sonhos? Damien Chazelle fez Babilônia. E, se dentro de nossas cabeças, todo o plano já está montado para transformar em realidade aquilo que imaginamos ser o melhor já feito dentro de nossa área, a falta de limitações, às vezes, faz com que acabemos nos perdendo em nossa grandeza e colocando coisas demais em um único projeto. Este é o caso no filme.

Cheio de grandes ideias para, novamente, homenagear a Hollywood de anos atrás, utilizando protagonistas complexos e dúbios, com um cenário vasto, novidades a todo instante e personagens únicos para mostrar. Envelopado por uma trilha sonora grandiosa, que pode ser mostrada dentro da projeção por conta de trechos em que uma banda de jazz se torna central. Além de uma mescla de gêneros que passa por comédia, drama, ação e sequências majestosas, com diversos figurantes e até mesmo um elefante. Parece ousado demais para um filme só. Mesmo um de mais de 3 horas de duração. E, de fato, é.

Não me leve a mal. O filme tem cenas e sequências memoráveis, que poderiam torná-lo um dos melhores do ano. O diretor é inteligente ao usar a construção inicial para nos passar o furor e êxtase vividos pelos figurões da indústria no local onde construíram um habitat próprio. Todo este momento de ascensão dos protagonistas até o topo e o princípio da queda é uma jornada em que o espectador acaba levado quase que flutuando de tão bem guiado pela projeção.

Mas, no momento em que decide demonstrar as várias faces da mesma queda, Chazelle, que também assina o roteiro, acaba se perdendo na grandiloquência. Embebido na própria onipotência, o realizador parece sentir falta de algum colaborador para lhe barrar e evitar que esse sonho de Ícaro acabe por levar o longa em direção ao sol, para lá perder as asas. Nem mesmo Steven Spielberg tem esta pretensão no filme em que conta a respectiva infância e juventude, já que tem Tony Kushner por perto para tornar o roteiro de Os Fabelmans mais palpável.

Se Margot Robbie atrai toda a atenção desde o primeiro minuto em cena, emprestando magistralmente com o magnetismo dela à personagem, que sabe usar a vulgaridade para avançar numa Los Angeles fervilhante, Brad Pitt tem momentos apagados, em que parece entrar no automático. Mas, no momento em que começamos a nos questionar quanto ao alcance do astro, ele o estampa na tela, ao conceder não só o próprio carisma, como resgatar do fundo de si uma profundidade dramática que faz transparecer o desespero de um astro que vê o fim cada vez mais próximo, não conseguindo se adequar à velocidade com a qual o trem do cinema está passando, ficando preso na mesma estação.

E no meio dessa montanha-russa de personagens, histórias e dramas, a brilhante trilha sonora consegue se adequar e acompanhar cada mudança, com a esperteza de um jazzista que sabe acompanhar as transições de uma jam. Os temas são excepcionais, mas são as apresentações “ao vivo” durante a película que realmente chamam a atenção. O cineasta relembra os tempos de Whiplash e La La Land, emprestando um pouco daquela experimentação quase oriunda de um videoclipe a serviço da trama. Criando mais um coprotagonista complexo na pele de Sidney Palmer, que encara a transição dos palcos para as telas e mostra os preconceitos da indústria e como a agilidade do sucesso pode encantar, ao mesmo tempo em que machuca.

“Toda esta coleção de fatores positivos e, ainda assim, o crítico tem a pachorra de falar mal”, pode estar indagando você, leitor. Em certo ponto, tendo a concordar com a questão, mas não é somente da somatória dos pontos altos que devemos nos munir para fechar esta singela análise. Como comentei no início do texto, o fator determinante para a queda do longa são os excessos. De histórias, tramas, duração… a partir do terceiro ato, os dramas já começam a se perder em si mesmos. A obra ainda consegue fazer o resgate para finalizar a narrativa de maneira bastante satisfatória, surpreendentemente.

Até os cinco minutos finais.

Nestes últimos momentos, o roteiro não sabe quando (ou mesmo se) quer terminar ou se vai seguir com uma última homenagem, uma última montagem, uma última reverência ao magistral mundo do cinema. Preso na própria homenagem, Chazelle tenta fazer um 2001 particular. E é neste momento em que falta algum amigo, um colaborador ou mesmo um produtor para colocar os pés do vencedor do Oscar no chão e mostrar o quão incrível o filme já é e quão melhor ele poderia ser com uns passinhos a menos no próprio sonho.